É o tipo de noite na qual eu
queria muito ter companhia. Um sábado qualquer, como todos os sábados de minha
vida, atualmente. Nessa idade e com esse arremedo de convívio social, ter
lembranças de uma época em que isso era diferente torna tudo muito amargo, e
ruim de engolir. Mas é a constatação, afinal: cheguei à aposentadoria.
A busca por oportunidades de
emprego e por uma saída viável e saudável da situação em que me encontro me
atraem inexoravelmente para este computador, seu monitor enorme e o fone de
ouvido, testemunhas de minha crescente inadequação social. Participar de
eventos sociais que aparentemente me distraem por algumas horas desse marasmo
não tem mais sido tão eficaz, pois percebo o quanto as pessoas têm sido
parcialmente atenciosas comigo apenas por uma questão de convenção social, ou
pelo menos é como as coisas parecem, hoje em dia. Eu careço de diálogo real, e
de gente interessante. Gente instintiva e essencialmente interessante, e não os
fantoches com quem me relaciono atualmente. Eu não consigo apontar para nenhum
conhecido com o qual queira estar, seja para beber cerveja ou simplesmente
conversar. Não sei se devo atribuir esse fenômeno ao meu estado constante de
frustração e decepção generalizada (depressão patológica) ou se só conheço
gente idiota, o fato é que está difícil ser civilizado e simpático.
Pouco tempo atrás, em um desses
frequentes acessos de raiva das pessoas que conheci outrora, tomei a decisão de
romper laços com várias delas em uma rede social. A raiva acumulada por ler
tanta idiotice não justificaria esse tipo de coisa, já que sempre fui muito
complacente com gente burra. O que me chamou atenção mesmo foi que, ao contrário
das outras vezes em que recorri a isso, dessa vez não tive remorsos. Estaria eu
passando por mudanças, metamorfoses do ego que podem me levar a um novo patamar
de misantropia e autocomiseração? Ainda não tenho dados para afirmar nada, mas
creio que logo, logo, posso muito bem retornar ao estado em que estava, exatos
vinte anos atrás, quando resolvi sair de minha varanda e conhecer pessoas.
Em minha mente, sempre retorno
àqueles anos, na virada dos anos 80, quando acreditava que o punk rock e as HQs
seriam a Nova Ordem Mundial, e que passaria os anos 90 em combate, seja contra
máquinas assassinas, ou invasores extraterrestres. Minhas expectativas de
futuro eram todas emprestadas do cinema ruim ao qual me submetia, em minha
vidinha de adolescente feio e esquisito que morava em uma cidade que odeia.
Leia-se: um estereótipo que vestia tão bem em mim quanto um velho casaco que
não queremos jogar fora por ser muito, muito confortável e quentinho.
Em pouco tempo vou chegar aos
40 anos. Não haverá festa, nem pretendo alertar ninguém disso, e se puder vou
me esconder de quem acha que vou estar muito à vontade e feliz comigo mesmo na
ocasião. Pretendo desaparecer nessa data. E confesso que isso também não me
agrada, sinceramente. Seria mais fácil se pudesse fazer todos esquecerem quem
sou eu, e tudo a meu respeito em suas mentes.
Mas esse nem era o motivo
dessa postagem. Eu ia escrever sobre outra coisa, sobre liberdade de expressão,
ativismos de ocasião e sobre a natureza dos embates ideológicos. Mas esqueci o
que ia dizer.